domingo, 14 de dezembro de 2008

Linhas de pesca - 1ª parte

As Linhas de Pesca

As primeiras linhas realmente finas, resistentes e mais ou menos transparentes que se utilizaram foram chamadas de fios de “seda”, receberam este nome por serem extraídas dos casulos dos bichos das seda. Até então eram usadas uma espécie de “fios de corda”, digamos assim, que devido à sua grossura, se pareciam mais com “cordões”.

A descoberta do fio de “seda” foi um grande avanço para as linhas de pesca, a tal ponto que ainda hoje se confunde o termo seda com os actuais nylons, que nada têm a ver com o antigo e autêntico fio de seda.

As linhas de pesca são, sem lugar para dúvidas, um dos acessórios mais importantes para o pescador e tem vindo a sofrer um processo de evolução ao longo dos tempos, fruto de avançadas pesquisas efectuadas nestes últimos 40 anos, resultando daí o aparecimento de materiais sintéticos de alta resistência e elasticidade, entre outras características. Assim sugiram as fibras monofiladas (o nylon, a poliamida e o polyester) e em seguida, as de fibras sintéticas microfilamentadas (Kevlar, Dyneema e Spectra), que são microfilamentos trançados.

Por força da política de marketing dos fabricantes e também por culpa dos pescadores, as linhas de pesca são como um parente pobre do nosso equipamento, onde se tenta poupar algum dinheiro abdicando de alguma qualidade em favor do último modelo de cana ou de carreto. Esquecemo-nos da sua importância como único elemento do nosso equipamento que nos liga à nossa captura.

O conjunto cana/carreto mais cara do mundo, não serão um grande investimento, se na hora da verdade, a linha ou o anzol falharem na sua missão de trazer-nos o tal troféu à muito desejado.

Para que a escolha de uma linha com qualidade não seja efectuada através do método de prova e erro - tantas vezes por nós utilizado e com algumas perdas de alguns peixes pelo meio - tentaremos apresentar com este tema e trazer ao vosso conhecimento, algumas características e propriedades gerais das linhas, de maneira simples, de tal forma que a próxima vez que formos comprar uma linha possamos efectuar uma boa compra.

Não nos podemos esquecer de que as indicações existentes na rotulagem efectuada por muitos fabricantes ou importadores não correspondem ás verdadeiras características das linhas, no entanto poderemos tomá-las como mera referência, não esquecendo também de que já existem no mercado uma grande quantidade de marcas com linhas certificadas.
(http://www.eftta.com/)

Neste contexto e sem entrarmos na especificidade dos diferentes tipos de pesca existente, optou-se por abordarmos este tema falando sobre dois tipos de linha de pesca:

Monofilamento, linha de nylon ou outros polímeros de uma só fibra.

Multifilamento, linha trançada a partir de várias fibras de Polyethylene.

Monofilamento

A História

Num período da história conhecido como o do “Terror”, durante a Revolução Francesa, quando quase toda a nobreza estava condenada à guilhotina, O Visconde DuPont de Nemours, um abastado banqueiro, fugiu para os Estados Unidos com todo o seu capital. A sua família organizou-se e centrou os seus negócios na fabricação de explosivos, sobretudo pólvora.
Em 1920, Dupont mudou todos os seus negócios para o sector têxtil, tendo criado um grupo de pesquisa ao qual se juntou Wallace Hume Carothers.
Este grupo e as suas pesquisas na Dupont, tiveram os seus primeiros sucessos em 1930 quando sintetizaram uma matéria designada de polychloroprene, onde fizeram a sua estreia no mercado com a designação de Duprene, tendo em 1936 ficado conhecido por Neoprene A primeira e a mais velha borracha sintética conhecida e que ainda tantas aplicações tem.

Em 1938 os laboratórios DuPont produziram uma fibra sintética forte e elástica a que chamaram nylon que substituiria por completo a linha de pesca composta por seda, lã e algodão.
Esperava-se que tivesse um grande êxito nas duas cidades Nova York (Ny) e Londres (Lon), e em honra a elas deram o nome à fibra (Nylon).

O nylon é obtido em diferentes combinações de diaminas com ácidos dicarboxílicos, sendo comuns a reacção de hexametilendiamina com o ácido adípico ou com o cloreto de adipoíla, para o nylon "6,6" (estes números referem-se ao número de carbonos de cada um de seus constituintes), e com o ácido sebácico ou o dicloreto de ácido sebácico, alternativamente para obter o nylon "6,10", entre outras variações

Os primeiros monofilamentos eram grossos, frágeis e rígidos, quase impossíveis de manejar em acção de pesca mas como qualquer nova invenção foi-se melhorando e aperfeiçoando até ao que conhecemos hoje em dia.

As Características

O Monofilamento é a linha mais utilizada e as suas características principais são:
· Memória
· Elasticidade
· Resistência
· Relação diâmetro-resistência
· Suavidade
· Cor

Memória:
É a capacidade do nylon de recuperar sua forma recta depois de sair de um carreto. Ao armazenar uma linha numa bobine, esta tende a adoptar uma forma cilíndrica, o problema radica em que algumas linhas retêm a forma de espiras durante muito tempo após ter sido lançada. A memória é pois, o fenómeno pelo qual a linha "recorda" a forma cilíndrica da bobine onde está colocada. Todas as linhas de monofilamento apresentam memória em maior ou menor medida, pelo que sempre será importante seleccionar uma linha que apresente a menor quantidade possível. Como mencionado acima, geralmente a memória é directamente proporcional à macieza da linha. Quanta mais memória presente na linha, maiores serão os problemas que causa, como problemas no lançamento, os nefastos "ninhos", pouco controle sobre a acção das amostras e falhas durante o ferrar.

Elasticidade:
A elasticidade é a propriedade que o monofilamento possui em esticar-se. Quanto mais elástica seja a linha, maior será a influência na sua capacidade de ferrar ou manejar o peixe e as suas " corridas bruscas”. Também demasiada elasticidade produz pouca força para a ferragem e pode provocar a fractura da linha durante uma corrida brusca. Um fio demasiado elástico impediriá de cravar correctamente o anzol devido à amortização que produz.
O ideal é ter um índice de elasticidade médio, 20 a 30%, ajudará a cravar bem e a manter o anzol na boca dos peixes. De facto, a maior parte das rupturas, dá-se precisamente durante este tipo de respostas. O uso deste tipo de linhas é muito recomendado para os menos experientes na pesca, porque são ajudadas sem se dar conta, pelo contrário, com um nylon pouco elástico há que ser muito rápido e trabalhar bem a embraiagem do carreto para compensar a ausência de elasticidade e evitar perder as capturas, situação que requer já alguma experiência de pesca.

Resistência:
Resistência é a capacidade máxima de suporte de peso de uma linha e normalmente vem expressa em kilogramas ou libras. Cada libra corresponde a 453 gramas.
É a resistência à tracção, quer dizer, quando nós pegamos numa linha de cuja resistência seja de 9 quilogramas, de acordo com o fabricante, isto significa que ao usarmos um dinamómetro, teria que partir ao chegar aos 9 kilogramas da força e não antes.

Infelizmente nem todos os fabricantes são honestos nestes dados. No caso do fio de nylon, dada a sua elasticidade, estes dados são para uma tracção progressiva e não param uma tracção repentina, onde a sua resistência é menor. Isto explica que as baixadas da linha para as espécies grandes são de uma espessura e de uma resistência maiores do que o resto da linha, dado que o peixe nos últimos metros quando nos tem á vista, emprega toda sua força para tentar fugir dando uns esticões fortes que poderiam partir a linha.
Outra característica importante que devemos de ter em atenção é a deteorização da linha, isto é a resistência à abrasão, ao desgaste por roçar nos fundos, ás anilhas da cana, à acção do sol e da água salgada, etc.Também aqui não temos nenhuma indicação do fabricante e não temos outro remédio senão confiar no vendedor ou nalgum amigo que tenha experimentado a linha ou em definitivo confiarmos na nossa experiência. Muitas pessoas pensão que a resistência da linha deve ser pelo menos igual ao peso do peixe que se pretende capturar e isto é um erro dado que os peixes no seu meio aquático pesam em média um terço do seu peso fora da água. Consequentemente nós podemos usar linhas da resistência menor e de uma maior capacidade de linha no carreto. No entanto nós devemos ser conscienciosos e não facilitar muito já que um peixe de 2 quilogramas, na luta pode exercer com uma força perto dos 10 quilogramas. Não quer dizer isto também, que a linha tem de ter tanta resistência, pois temos que contar com embraiagem do carreto e com habilidade do pescador para capturar o peixe sem chegar a partir a linha. Relação diâmetro-resistência: O Diâmetro é simplesmente a medida de uma secção de linha. A linha é um grande cilindro de muito comprimento e um diâmetro mínimo. Nas linhas, o diâmentro aparece geralmente em milímetros. Se temos que lançar longe ou carregar muita linha, deveremos escolher o mínimo diâmetro, se estas necessidades não são tão prioritárias, poderemos incrementar a grossura para ganhar em comodidade e segurança de uso. A resistência de uma linha, como já vimos, expressa-se na quantidade ou número de kg ou libras (0.454 g) que uma linha pode "suportar" antes de se partir.

Quando o rótulo indica que a linha é de 10 kg, por exemplo, significa que esta deve suportar AO MENOS 10 Kg, mas o problema radica em que numerosas provas de laboratório, demonstraram que a grande maioria das linhas do mercado na realidade resistem um pouco menos do que o rótulo indica.
Também há que recordar que a resistência da linha é maior quando esta em seco do que quando está "húmida" e que o monofilamento pouco a pouco vai absorvendo humidade tanto do ar como do água e quando se satura, perde entre o 10% e o 15% de sua resistência original.
Em linhas do mesmo tipo, o maior diâmetro proporcionará uma maior resistência, ou seja, aguentará um maior peso. No entanto, não é na resistência ao peso que devemos pensar na hora de optar por uma linha de maior diâmetro e sim na sua resistência ao desgaste, que também tem relação directa com a medida. Quanto mais grossa for a linha, maior será sua resistência ao desgaste. É necessário prevenir quanto a isto no caso de pescas realizadas em locais onde a linha poderá sofrer atrito com pedras e outros obstáculos.

Suavidade:
Algumas linhas são mais flexíveis que outras, ou de outra maneira, podem-se dobrar e manusear com mais facilidade devido à sua macieza. Em geral, uma linha suave, resulta vantajosa devido a ser mais fácil de lançar e produz movimentos mais realista quando se utiliza amostras. Por outro lado as linhas mais duras tendem a apresentar mais memória (ver acima) e alterar o movimento das amostras mais ligeiras, sendo também a causa do efeito de chicotear na ponta das canas, sobretudo nas canas de acção lenta, reduzem a distância de lançamento, além de outros efeitos indesejáveis. Por outro lado, uma linha demasiado suave, será também demasiado elástica, apresentando os mesmos problemas atrás mencionados.

Cor:
Este tema, é causa de verdadeiro debate pois para alguns tem uma importância vital, enquanto para outros nem por isso. As cores mais comuns são o transparente, branco, azul, verde e cinza, numa grande gama de tons. Na verdade, em certas condições, a cor da linha pode influir na sua visibilidade debaixo de água, pelo que muitos pescadores tentam utilizar linhas de uma cor similar à da água onde estão a pescar. Por outro lado existem cores mais luminosas ou fosforescentes que servem para o pescador ver melhor as linhas com o tempo em más condições ou de noite. Julgo que a cor não deve ser um factor determinante para adquirir uma linha, deverá ser dada maior importância à sua resistência e ã proteção aos raios ultravioleta (UV).

Os Factores de Deterioração

Vejamos quais os factores que mais influenciam a deterioração da linha e aos quais devemos periodicamente dar atenção, para manter o nosso equipamento em boas condições e não termos uma má surpresa.

- Luz Solar
- Calor
- Água
- Olhal ou pata do anzol
- Nós acidentais
- Rasgos, golpes e compressões
- Torceduras
- Partes do carreto danificadas
- Anilhas da cana deterioradas
- Enrolamento inadequado
- Nós fracos ou incorrectamente atados

- A luz solar e os raios ultravioleta, afectam os polímeros (nylon), deixando-os quebradiços ao causar uma espécie de cristalização das moléculas que formam o monofilamento.

- O calor debilita a linha, deteriorando lentamente a estrutura do material polimérico do monofilamento, que pode partir por fricção, durante uma corrida veloz de um peixe grande.

- A água, a húmidade e especialmente a água salada que ao secar produz cristalizações.

- O olhal/pata do anzol ou a sua zona de empate (haste), por oxidação ou descamação dos esmaltes ou cromados, podem cortar a linha.

- Nós acidentais que aparecem e que acabam por apertar debilitando a linha.

- Rasgos, golpes e compressões que podem desfiar ou diminuir a secção da linha fragilizando-a.

- Torceduras, o retorcimento da linha também pode deteriorá-la, sabendo-se que quanto maior for o ratio maior poderá ser o número de torceduras por cada volta que se dá á manivela.

- Partes do carreto danificadas ou desgastadas, podem debilitá-la pela alta fricção que produzem.
- Anilhas da cana deterioradas ou em mau estado, podem produzir rasgos.

- Enrolamento inadequado na bobine do carreto, pode estar a linha demasiado apertada e por tanto comprimida, ou retorcida ao não ser bem rebobinada. Às vezes a forte tensão de recolha durante uma luta, a humidade acumulada, as diferenças de temperatura, fazem que as espirais mais profundas, as mais próximas ao eixo da bobine do carreto, se estrangulem por aprisionamento. É curioso que isto não o notemos até que não sacamos todo o fio da bobine, mas surpreender-nos-ia se o fizéssemos com frequência, ao ver com que facilidade se produz.

- Os nós fracos ou incorrectactamente atados causam sérios problemas. por isso devemos verificá-los com frequência, assegurando-nos de seu bom estado.

Dependendo da frequência das idas à pesca deveremos substituir as linhas de Monofilamento depois de uma ou duas temporadas de pesca.

Considerações

O mais importante que deveremos ter em conta na hora de escolher uma linha é, na minha opinião sua resistência(carga de rotura). Esta não se mede, como muitos pensam, pelo diâmetro da linha, o qual varia em função da marca (fabricante) e qualidade de material. Devido a este facto e com o fim de regular de alguma maneira as diferenças existentes entre as muitas linhas existentes no mercado, a IGFA (International Game Fish Association) estabeleceu um critério lógico baseado na capacidade da linha em função da carga de rotura. Esta capacidade determina a força que um peixe lhe pode opor quando pescado. É nisso que se baseia e representa para a IGFA a intensidade de uma luta e portanto, o mérito da captura.
Fazendo justo ao marketing muitas das marcas anunciam valores, para uma mesma resistência, embora as linhas tenham diferentes diâmetros, gerando-se a confusão e até alguma polémica. Para que houvesse um critério compreensível e justo dentro deste sistema e para que de certa forma os sistemas métricos diferentes existentes, não constituíssem um problema, a IGFA criou um critério de valores da resistência a nível mundial, respectivamente quanto ao Sistema Métrico /Sistema Inglês/Resistência :

1 kg. = 2.20 libras = 2 libras
2 kg. = 4.40 libras = 4 libras
3 kg. = 6.61 libras = 6 libras
4 kg. = 8.81 libras = 8 libras
6 kg. =13.22 libras =13 libras
8 kg. =17.63 libras =17 libras
10 kg. =22.04 libras=20 libras
15 kg. =33.06 libras =30 libras
24 kg. =52.91 libras =50 libras
37 kg. =81.57 libras =80 libras
60 kg. =132.27 libras =130 libras

A medida máxima permitida pela IGFA para a pesca desportiva é de 130 libras/60kg enquanto a medida mínima que se comercializa é de 2 libras/1kg de resistência.
Na nossa escolha deveremos ter em conta que quanto menor seja a resistência da linha, a sua grossura também diminuirá e consequentemente, será menos visível para o peixe.
Não devemos esquecer que uma linha fina pesa menos que outra de diâmetro maior e que oferece uma acção mais macia, permitindo que a isca se mova na água de maneira mais natural, por isso e tendo em conta que as iscas que utilizamos têm um peso específico, consideraremos que uma linha mais grossa oferecerá mais segurança mas pouca naturalidade. Na nossa escolha, temos de ter em conta o seguinte quadro de resistências:

0.10 mm = 0,8 kg
0.12 mm = 1,1 kg
0.15 mm = 1,6 kg
0.18 mm = 2,2 kg
0.20 mm = 2,8 kg
0.22 mm = 3,2 kg
0.25 mm = 4,1 kg
0.30 mm = 5,8 kg
0.35 mm = 7,9 kg
0.40 mm = 10 kg
0.45 mm = 12 kg
0.50 mm = 15 kg
0.60 mm = 21 kg

Como a escolha de uma linha de pesca, com a resistência ideal, não é tarefa fácil, senão mesmo impossível, atendendo às diferentes condições que poderemos encontrar, poderemos seguir um princípio que nos pode ajudar: Escolher sempre uma linha cuja resistência seja o dobro do peso das espécies que esperamos capturar.



Continua...


Paulo karva

4 comentários:

Ernesto Lima disse...

Viva Paulo!

É imperdoável, não ter vindo por aqui mais cedo, para poder comentar este excelente artigo!

A história, as características, está cá tudo!

Muito bom! Obrigado Paulo e parabéns!

Ernesto

Paulo karva disse...

Viva Ernesto, agora fizeste-me rir, com o "imperdoável". Estás perdoado. LOL

Obrigado pelo apoio.

Abraço
Paulo karva

Anónimo disse...

Viva Karva

Entre duas dentadas num coelhinho com ameijoas e uns toques no tinto da casa um amigo comum falou-me um dia destes ao jantar no seu Mar Salgado
Valeu a pena seguir a sugestão
Artigos interessantes, bem elaborados, dos que se lêem sem custo até ao fim e que passam a ser referências do tema
Aprendi umas coisas... vou passar a vir aqui também às aulas!
Um abraço

João Martins
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Paulo karva disse...

Viva João Martins

Obrigado pelo seu comentário. Optei por outra maneira de fazer as coisas, diferentes da do nosso amigo comum, penso eu.
A publicação é mais dilatada no tempo, já que isto dá algum trabalho.
Com ou sem coelhinho com ameijoas bem regado, apareça sempre que quiser.

Abraço
Paulo karva